Um conto sobre a dor de não ser invejável
Ininvejável
Juliano estava trabalhando na tabela de compras quando Manuela chegou insistindo para que ele levasse um presente de boas-vindas ao gerente recém-chegado. A moça insistia e insistia porque apostara com os colegas que conseguiria fazer o “funcionário padrão” largar o serviço.
— Mas, Juliano, o que custa você levar um presentinho pro homem? Ele é o nosso novo chefe.
— Já disse que tô ocupado, Manu! Tira esse presente da minha mesa. Eu já ajudei na vaquinha. Manda outro entregar ou vai você mesma.
— Eu não posso. As pessoas iam ficar com inveja de mim.
— E daí? — perguntou Juliano, tirando o pacote da mesa.
— Daí que inveja mata — respondeu Manuela, fazendo o infalível charminho que usava para convencer Juliano a trabalhar em seu lugar. — Você não quer que eu morra, né, Julianinho?
— Ah, entendi por que você quer que eu vá. Você quer que eu morra no seu lugar, quer que o pessoal tenha inveja de mim.
Manuela olhou pro relógio e se irritou porque o tempo combinado para ganhar a aposta estava passando.
— Inveja de você? Ninguém tem inveja de você, Juliano. Você é ininvejável! — disse, irônica.
— Como assim?
— Nada, bobagem, brincadeira! Esquece!
— Esqueço coisa nenhuma — respondeu Juliano, magoado. — Explica o que você quis dizer. Explica que eu levo o pacote.
— Bom, é que você é meio insignificante aqui no escritório. Ninguém repara que você existe.
— Eu carrego este escritório nas costas. Sou um ótimo funcionário.
— É, mas eu sou mais popular que você. Sou conhecida.
— Conhecida como puxa-saco!
— Pode ser, mas eu sou boa nisso e não te invejo — respondeu Manuela, ferida. — Nós cinco fizemos uma reunião e decidimos que só você poderia entregar o presente porque o novo chefe nem repararia na sua presença. Assim nenhum de nós levaria vantagem por ser o primeiro.
— Eu sou invejável — insistiu Juliano. — O seu namoradinho Laércio, que é vagabundo, pode até não me invejar, mas o Figueira deve morrer de inveja do meu casamento feliz.
— Não fala assim do Laércio! Ele não precisa trabalhar porque sabe entrar nos esquemas. Já você, nem quando nós te convidamos, você topa.
— Eu não sou ladrão...
— Cala a boca! Você pediu, vai escutar. O Figueira não quer nada com o seu casamento feliz. Ele acha a sua mulher um lixo.
— Dá aqui esse presente, Manu! Dá pra mim que eu entrego.
Manuela voltou para sua mesa. Dobrar Juliano sempre lhe dava uma sensação de vitória, mesmo quando não havia uma aposta envolvida.
Juliano entregou o presente, os esquemas e os colegas. Foi demitido e continuou ininvejável.
Conta-se que o Diabo reina entre as mulheres. Alguém discorda?
ResponderExcluirrsrsrs Reina entre as mulheres e governa entre os homens. O ser humano em geral não presta.
ResponderExcluirCarla, achei injusto o Juliano ser demitido já que era bom funcionário...Juro, ainda pego essa Manuela!!!
ResponderExcluirCarla, por coincidência vi esses dias o "Tropa de elite 2". A relação que me vem do filme com seu conto é a impossibilidade em que se encontra o personagem que quer combater a corrupção num ambiente dominado por corruptos. Mas o conto: é sintético, econômico, a situação em que os personagens se inserem é sugerida fragmentariamente nos diálogos ágeis. Todo o conto é ágil, metonímico, insinuante.
ResponderExcluir...e a Manu está sentada à direita dele. Que diabólica!! rs
ResponderExcluirÉ, gente, a Manu é uma peste. Prometo que, num próximo conto, eu corto as asinhas dela. :)
ResponderExcluirMeu marido diz que o Juliano "não teve inteligência emocional pra lidar com aquela cambada". Aproveitando o comentário certeiro do Afonso, só posso dizer que nem o BOPE resolvia. :)
Beijos!
Olá Carla, que tudo esteja e permaneça bem contigo!
ResponderExcluirTenho certeza que em Brasília no mercado de negociatas, ela nem passaria perto.
Não me espantam atitudes feito esta, estou cansado de saber, é somente um retrato de uma das condições humanas, abominável, entre outras!
Parabéns Carla, por sempre mostrar em seus textos, situações reais. A Manu é só mais uma brasileira que sabe dar o seu jeitinho!
E Carla, pelo aspecto do embrulho, o presente deve ser fino!
Desejo a você e todos ao redor felicidades sempre, agradecido pelas visitas e comentários, a sobre a foto que postei, deve conhecer, apenas ainda não fotografou deste ângulo. Fico contente por gostar de minhas imagens de sua cidade, que por sinal gosto muito e sempre visito, já por mais de cinco anos seguidos! Abraços e até mais!
Oi Carla, fiquei com pena do Juliano também!
ResponderExcluirUm grande bj
Ah, que horror. Pelo menos na ficção o bem podia vencer, né? Ele tinha que ser demitido? Vou esperar pra ver as asinhas da Manuela cortadas e o Juliano dar a volta por cima.
ResponderExcluirCampanha "Queremos o capítulo 2".
Bjoooo
Muito muito bôua. Uma saudação a esta pecaminosa Manuela, muito mais invejável, realmente, que o Juliano. hahaha.
ResponderExcluirmuito bem desenvolvido, vive-se o conto.
ResponderExcluirGosto dessa dinamica.
Bom teu blog.
Maurizio
Olá Carla... essa é a minha primeira vez em seu blog e já chego dando de cara com um conto tão realista. Hoje em dia precisamos acima de tudo da famosa inteligencia emocional para não nos deixarmos influenciar por opiniões alheias maldosas.
ResponderExcluirEspero que a Manu aprenda que existe a lei do retorno e ninguém ficará livre dela.
Um abraço carinhoso
Um belo e elucidativo dialogo entre Manuela e Juliano.
ResponderExcluirA toda propotente Manuela acabaria por levar por diante o seu plano.
Olá Carla minha cara, passando pra agradecer todo o carinho de suas visitas e comentários, e desejar a você e todos ao redor sempre esta felicidade almejado por todos, abraços e até mais!
ResponderExcluirCarla
ResponderExcluirDesculpe eu ir entrando sem sequer bater na porta:), mas atraiu-me o nome do blog - livros é comigo... - e ainda bem que entrei pois gostei bastante de seu espaço.
Dei uma olhada geral e li, com atenção, o seu último post.
Texto bem esplanado, retratando uma situação que é mais vulgar do que se pode imaginar: os bons vão p'ra rua, e os lambe botas conservam o seu emprego.
Voltarei. Gostei muito do seu estilo de escrita.
Ah! e vou fazer-me sua seguidora. Se quiser fazer o mesmo dar-me-á muito prazer.
Boa semana. Beijinhos
Oi, Carla!
ResponderExcluirTodos os meus textos são fictícios, mas cada um tem um quê de realidade. Aprecio muito o romantismo, mas acho o realismo/naturalismo bem mais elegante.
Aproveito para entrar na campanha "capítlo dois". Nada contra as mulheres, mas a Manu tá feita comigo.
Abraço!
Bem típico das armações do cotidiano humano...
ResponderExcluirSe Juliano não fosse tão ininvejável ninguém se importaria com a perfeição e dedicação do srviço dele.
Abraços